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COLUNA MOBILIDADE EM FOCO – LASTWAGEN (CAMINHÃO) L-1319, O PRIMEIRO MÉDIO/SEMIPESADO DO BRASIL COM INTERCOOLER

A primeira metade dos anos 80 foram anos de muitas glórias e de lançamentos significativos para a Mercedes-Benz do Brasil, divisão de caminhões, apesar da crise econômica que se prolongou de 1980 a 1985. Tudo começou em 1979 com a segunda crise do petróleo (a primeira foi em 1973), resultando em elevação do preço dos combustíveis, disparada da inflação, perda do poder de compra dos salários, restrição de crédito e de vendas, inclusive de caminhões. A economia em crise levou a categoria trabalhista dos Metalúrgicos a uma longa greve de 43 dias nos meses de abril e maio de 1980, prejudicando a produção da fábrica da estrela de três pontas. Mesmo assim a Mercedes-Benz encerrou o ano com quase 47 mil veículos fabricados, 53% a mais do que a produção conjunta da Ford e da Chevrolet.

Apesar da recessão econômica, a diretoria da Mercedes-Benz anunciou em janeiro de 1981 um maciço programa de investimentos que, em quatro anos, elevaria a produção para 100 mil veículos por ano. No entanto, intenção é uma coisa e realidade de mercado é outra. O que ocorreu foi à deterioração da economia nacional, queda acentuada de vendas e a elevação do estoque da montadora alemã para mais de 13 mil caminhões e ônibus. O pátio cheio levou a fabricante a suspender em agosto as obras de expansão das duas fábricas anunciadas em janeiro e a demissão de 6.200 empregados numa tacada só, reduzindo o número de colaboradores em 30%. A este número se somou as demissões dos demais fabricantes de veículos e de autopeças do ABC paulista, chegando a mais de 60 mil trabalhadores dispensados. Apesar do ano drástico a Mercedes produziu quase 37 mil veículos comerciais, somente 21,27%% a menos do que em 1980. A queda nas vendas para a concorrência foi maior, média de 33%.

Para conter custos a Mercedes-Benz sequer participou do Salão do Automóvel de 1981. Guardou para setembro de 1982, na III Brasil Transpo, aquilo que era para lançar em 1981, sua nova cabine semi-avançada. Era a mesma AGL lançada em 1964 com o L-1111, cuja primeira reformulação ocorreu em 1972 com a opção de teto alto, escotilha de ar no teto, volante de direção de dois raios (curvos) e para-brisa maior. Em 1978, de novidade, apenas o volante de direção, que passou a ser de cor preta e não mais o “osso de elefante” de até então, sem contar que a cor da escotilha de ar passou a ser branca, independente da cor da cabine, o que não ocorria antes. Se contabilizarmos, foram 10 anos sem novidades quanto à cabine (1972 a 1982). A nova AGL ano 1982 trazia nova grade dianteira de refrigeração do motor, composta por quatro faróis retangulares, dois de cada lado, um em cima do outro, substituindo os dois de formato ovalado da linha fabricada até 1981. A nova grade passou a ser chamada de “máscara negra”.

Caiu no gosto do consumidor e caminhões mais velhos, ao serem reformados, muitos deles passavam a serem equipados com a máscara negra. Dava mais charme e ares de modernidade ao caminhão. Entre as mudanças da linha 1982 para 1983, constam ainda novo para choques, espelhos retrovisores maiores, novo painel do motorista, novo cluster de instrumentos, melhoria da vedação termoacústico, freios pneumáticos de série para os caminhões médios, semipesados e pesados, além dos chassis de ônibus e para os monoblocos. Foi lançado também o L-2213 movido a álcool, com motor de cinco cilindros, 9,6 litros e 192 cv de potência máxima, com tração 6 x 4 e caixa de seis marchas a frente, vocacionado a indústria canavieira. Os motores que equipavam a família 13 (1113, 1313, 1513, 2013 e 2213) ainda era o OM-352; e a família 16 (1116, 1316, 1516 e 2216 recebia o motor OM-352A), mas estes motores foram retrabalhados, diversos melhoramentos foram introduzidos para melhorar a combustão, reduzir o consumo de óleo diesel e aumentar a vida útil. Para tanto foram modificados os bicos injetores, sedes de válvulas, coletores de admissão e dutos de refrigeração do bloco, além de pistões e anéis com novo formato. Para 1983, o primeiro ano pra valer dos novos máscaras negras, a coisa não começou bem.

Mais demissões na fábrica da Mercedes-Benz, 2.900 em janeiro e 2.500 em julho. A produção diária baixou de 290 para 90 unidades, uma queda vertiginosa. No segmento dos Pesados, de setembro de 1982 a agosto de 1983 a montadora fabricou o LS-1924A com nova roupagem, LS-1924A máscara negra, incluindo o novo painel do motorista. Porem ele foi substituído pelo LS-1929, com capacidade de tração maior, passou de 40 para 45 toneladas. Esta CMT (capacidade máxima de tração) a Mercedes pretendia lançar em 1976, assim que lançou o LS-1924A, mas manteve a mesma CMT do LS-1924. Por que LS? LS significa “Sattelschlepper”, cavalo mecânico, caminhão reboque. O LS-1929 recebeu novo eixo traseiro, mais robusto, capaz de receber via eixo cardam a potência de motores de até 400 cv, embora o LS-1929 mantivesse o mesmo motor OM-355-A do LS-1924A, de 285 cv. A performance maior do 1929 requereu nova caixa de câmbio, ZF Ecosplit de 16 marchas a frente, sincronizadas, a mesma dos Volvo N10, N12.

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Para a linha 1984 as mudanças chegaram aos L-608D, L-608E, rebatizados como L-608D, L-608E Nova Série. Quebra vento foi incorporado, vidros das janelas passaram a ser de levantar, antes eram de correr, espelhos retrovisores maiores, novos bancos mais anatômicos e faixas decorativas nas laterais faziam parte da perfumaria. Foi também o ano do retumbante lançamento dos ônibus monoblocos O-370 RS e O-370 RSD, uma revolução nas estradas e rodoviárias. Voltando aos caminhões, em agosto de 1984 estreou o LS-1524, CMT de 35 toneladas, sucessor do LS-1519. O 1524 recebeu o mesmo motor do 1519, OM-355/5, mas aperfeiçoado com a introdução da turbo alimentação, rebatizado como OM-355/5-A, potência alterada de 192 para 238 cv. Outra novidade foi a chegada do Turbocooler no motor OM-355/A, que equipava o LS-1929. O novo engenho, agora OM-355 LA, com turbo e intercooler, passou a tracionar o LS-1932, cuja potência máxima passou de 285 para 326 cv. Com capô de fibra de vidro em vez do aço do capô do 1929, além de duas entradas de ar nas laterais.

Após seis parágrafos chegamos ao ano de 1985 e, por fim, ao caminhão que é o tema da matéria, L-1319, o primeiro Médio e Semipesado do Brasil com motor com aftercooler, tubocooler ou intercooler, três designações que significam a mesma coisa, motor turbo mais sistema com resfriador do ar de admissão, fator que aumenta a potência. Era o mesmo princípio empregado no motor do Scania T112H e R112H Intercooler; Volvo N10 e N12 XH Intercooler; e Mercedes LS-1932. O engenho que permitia aumento de potência, torque e diminuição de consumo de óleo diesel em um motor de mesma cilindrada que a versão turbo, consequentemente, aumento da velocidade média e menor tempo de viagem. O que era exclusividade dos caminhões do segmento dos Pesados a partir de 1985, a Mercedes-Benz lançou de forma pioneira no mesmo ano nos brutos Médios e Semipesados. Era pra ser uma revolução nas estradas. Pena que o L-1319 era e é tão raro quanto um elefante albino, uma mosca branca ou a gente ver um disco voador (OVNI) no espaço. Segundo dados garimpados por Evandro Fullin, do site http://caminhaoantigobrasil.com.br/, 25 clientes da Mercedes-Benz foram selecionados em 1985 para testarem 50 unidades do L-1319.

Da Ford, linha de caminhões ano 1985/1986, os brutos que mais se aproximavam quanto à potência eram os Cargo 1117, 1317 e 1517, equipados com motor Ford, seis cilindros, turbo, 6.571 cilindradas, 165 cv de potência e torque de 53,8 mkgf. Outra concorrente, a Volkswagen, os Volks mais potentes eram o 11-130 e 13-130, com motor MWM D-229.6, seis cilindros, aspirado, 5.883 cc, 132 cv de potência e torque de 37,7 mkgf. A WV, além dos MWM diesel, disponibilizava ainda o motor V8/318-3E, mas do ciclo Otto, alimentado por álcool, 5.212 cc, 156 cv de potência e torque de 36,4 mkgf. Apesar da potência 24 cv maior que o MWM diesel, o torque era 1,3 mkgf menor. Este motor tracionava os caminhões VW 11-160 e 22-160 (6 x 4), o último, canavieiro. Da Mercedes-Benz o L-1319 viria a disputar mercado com os modelos L-1116, 1316, 1516, 1519 e 2216. Os MB 1116, 1316, 1516 e 2216 eram equipados com o motor OM-352A, seis cilindros, turbo, 5.675 cc, 156 cv de potência e 44 mkgf de torque (Norma alemã DIN).

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O 1519 era tracionado pelo motor OM-355/5, cinco cilindros em linha, aspirado, 9.650 cc, 192 cv de potência máxima, 67 mkgf de torque máximo. Os 1319 saíram de fábrica com entre eixos de 4,80 metros. Com este comprimento, creio eu, todos os 50 caminhões foram configurados como 6 x 2 (trucados), pois esta distância entre o eixo dianteiro e o eixo traseiro (de tração) era a maior oferecida pela Mercedes-Benz. Portanto, em vez de 1319, melhor teria sido batizá-lo como L-2219. Mas aí teríamos canibalismo interno, pois a MBB já tinha os modelos L/LK/LB- 2219 e LA-2219, com o mesmo motor do 1519. Por isso, possivelmente, a opção pela identificação L-1319. O L-1319/48 foi equipado com um novo motor, de nomenclatura técnica OM-366 LA “Turbocooler”. O propulsor, além da turboalimentação, era equipado com resfriador do ar de admissão, sistema inédito em caminhões Médios e Semipesados. A potência máxima chegava a 190 cv e o torque (momento binário), em 63 mkgf. Devido ao maior torque uma nova caixa de câmbio foi lançada para o modelo, MB G3/60-5/7,5, com cinco velocidades a frente.

O eixo traseiro era o HL-4. Itens mais que necessários para a maior potência e torque do motor, já que, por exemplo, o L-2216 era equipado com a caixa de mudanças G 3/60 e o L-1519 com a AK 6-80/9. Quanto a eficiência térmica do engenho de força, o L-1319 tinha 34 cv e 19 mkgf a mais que o 2216, 1516, 1316 e 1116. Em termos porcentuais, 21,79% a mais de potência e 43,18% a mais de torque. Consultando uma foto de arquivo do L-1319 com o cofre do motor aberto, assim como ocorreu com o LS-1932, 1933 e 1934, que foram “mulas” dos futuros MB LS-1935 e 1941, possivelmente o 1319 rodou unicamente com o motor OM-366 LA turbo alimentado, sem o sistema de intercooler. Motivo? Não caberia no apertado cofre do motor da cabine tipo AGL do L-1319 o engenho de resfriamento do ar de admissão. E, se possível fosse, a potência seria de 210 e não 190 cv. E o torque máximo saltaria de 63 para 67 mkgf. O rival direto mesmo do L-1319 era o L-1519. O 1519 alcançava 192 cv de potência (DIN) e 67 mkgf de torque com o motor OM-355/5 de 9.650 cc. O 1319, com o motor OM-366 LA de 5.958 cc, 190 cv de potência e 63 mkgf de torque. Quanto a eficiência térmica, o 1319 conseguia extrair 31,66 cv/litro. Já o 1519, 20 cv/litro. Rendimento térmico de 58,3% a mais para o 1319.

Apesar de um cilindro a menos, cinco para o 1519 e seis para o 1319, o 1519, além de aspirado contra a turbo alimentação do 1319, precisava de 3.692 cilindradas a mais para conseguir a mesma potência. A potência na rotação nominal de 1.400 rpm do 1519 era de 122,18 cv. Já a do 1319, na rotação nominal de 1.600 rpm era de 116,92 cv. Qual dos dois andaria mais, teria a melhor média de km/hora rodados? Se na mesma configuração, trucados, mesmo PBT, embora a Tara do 1519 fosse maior, suas reduções de eixo traseiro eram próximas (4,875 e 5,625 para o 1519) e 4,875 e 6,844 para o L-1319. O 1319 era mais leve, poderia levar mais carga, motor de menor cilindrada (mais econômico) e com a relação traseira mais alongada (5,625), chegaria na frente do 1519 sempre num mesmo trajeto. Sem contar o conforto. A maioria dos 1519 era equipada com a caixa de câmbio ZF AK 6-80/9 (caixa seca). A ZF S 6-80/9, sincronizada, era opcional e mais cara. O 1319 vinha com caixa sincronizada e o seu conforto termo acústico era superior ao do 1519, muito barulhento e com problemas de superaquecimento da cabine. Se, no Brasil, o L-1319 não passou da fase de protótipos, consta que para os Estados Unidos foi exportado centenas de unidades em regime CKD (desmontados). No Brasil o 1319 foi “mula” do caminhão que seria lançado em 1992, o L-1621 Turbocooler, com potência elevada de 190 para 210 cv e o torque passou de 63 para 67 mkgf.

Texto/matéria: Carlos Alberto Ribeiro.

Rafael Brusque - Blog do Caminhoneiro

Nascido e criado na margem de uma importante rodovia paranaense, apaixonado por caminhões e por tudo movido a diesel.

2 thoughts on “COLUNA MOBILIDADE EM FOCO – LASTWAGEN (CAMINHÃO) L-1319, O PRIMEIRO MÉDIO/SEMIPESADO DO BRASIL COM INTERCOOLER

  • Primeiro, o modelo L-1319 teve sim intercooler, contava com radiador um pouco mais fino e o intercooler a sua frente, reservatório de água do radiador um pouco diferente. Só porque a potência do seu sucessor era maior, não quer dizer que não tinha intercooler, exemplo disso é o 112HS(333cv) e o 113H(360cv), pela lógica do editor, o 112HS não teria intercooler. Segundo, denomina-se com prefixo 13 pois suporta 4,5 toneladas no eixo dianteiro e 8,8 toneladas no traseiro que somados dão aproximadamente 13 pq foram assim que sairam de fábrica e não como seriam usados. Se fosse 6×2 seria 2019, 20 pra diferenciar do 6×4 2219 e do 6×6 1819, embora ambos fossem pra 21,5 toneladas de PBT, exceto o último que era 18,5 toneladas. Terceiro, o modelo 1519, possui PBT pouca coisa maior, e CMT de 32 toneladas que te dava a possibilidade de engatar julieta podendo assim transportar mais carga (motivo pela sua tara ser maior e seu motor também). O 1519 ainda pertence a uma categoria diferente, o modelo mais próximo dele seria o 1318, o 1518 também com PBT maior, não serve de comparativo para o 1319. Qual dos dois gastaria menos, depende das circunstancias, bota os dois pra subir serra e verá que o 1519 por ter um torque maior em rotações menores terá uma dinâmica melhor, assim como o 1319 pode fazer melhor média no plano, ou não, motores 5 cilindros são mais econômicos que os de 6 com mesmas características. Mas acho que comparando o intercooler com um cilindro a menos, o intercooler ganha. O turbo não influencia tanto, só diminui o tamanho do motor para mesma potência.

  • Jeferson Campos

    Até hj respeitado, pena que se vê poucos rodando,e bem mal conservados.

Fechado para comentários.

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