Roberto Dias Alvares‏Z-Colunas

RACISMO NA ESTRADA – Cavalo Mecânico Volvo NL 12 6×4

Cavalo Volvo NL12 trucado
dirigido pelo Benedito.
Resistente e forte pesado.
Na estrada, verdadeiro mito.

Benedito é um carreteiro.
Ombros largos deste mulato.
Também é bom violeiro.
Excelente cantor de fato.

Nas paradas de caminhão
logo após o jantar,
Benedito pega a viola na mão,
e com amigos começa a tocar.

Vai até bem tarde a cantoria,
lanchonete ou em torno da fogueira.
Para caminhoneiros motivo de alegria.
Segue feliz nessa vida seresteira.

Negro com orgulho de sua cor.
Benedito nunca fora discriminado.
Honesto, homem trabalhador.
Já havia muitos quilômetros rodado.

Certa vez dirigindo na rodovia,
carro encostou em sua traseira.
Ultrapassar ali não conseguiria.
Ele apertava sua máquina estradeira.

Seu cavalo Volvo era potente
e no trecho mostrando garra.
Motorista do carro, negligente.
quis fazer ultrapassagem na marra.

Benedito para o carro sinalizou
que vinha outro em sentido contrário.
Mas isso de nada adiantou.
Quis passar de modo temerário.

Benedito tirou para o acostamento
para o carro com outro não colidir.
Evitou deles um choque violento.
Pneu do semirreboque acabou por explodir.

O acostamento era impraticável
mas se não tirasse seu caminhão,
o acidente seria inevitável.
Teve prejuízo pela boa ação.

Seguiu com a carreta em frente
e aquele carro andava devagar.
O que o motorista tinha em mente?
Sinceramente não sabia o que pensar.

Abriu para fazer a ultrapassagem
e o motorista do carro acelerou.
Estavam atrapalhando sua viagem.
Algum moleque desocupado, pensou.

Apertou seu Volvo trucado
que respondeu á altura.
Puxando semirreboque pesado
A sua lida era bem dura.

O carro devagar novamente,
atrasando a vida de Benedito.
Ultrapassar era premente.
O carreteiro já estava aflito.

O carro com vidro escuro
não deixava ver o ocupante.
Benedito no trabalho duro
acelerou o seu gigante.

Não conseguiu distância impor
pois o carro acelerou de novo.
Benedito chamou o bruto no motor.
Já ia a cento e dez o seu Volvo.

O carro aproximou-se veloz
mas Benedito manteve o pé no fundo.
Vidro aberto, mulher gritou em alta voz.
“Sai da frente seu negro imundo”.

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Benedito viu claramente
casal com crianças atrás.
Iam já longe á sua frente.
Aquilo o magoou demais.

Mas Benedito, homem humilde
engoliu a seco conteve a magoa.
Lembrou-se da esposa Matilde.
Bebeu um grande gole de água.

Esposa e filhos já tinham sofrido
com alguma ofensa racista.
Mas ele nunca fora assim ofendido.
Agora na estrada sofria o motorista.

Logo a frente no acostamento
o carro parado, parecia a sua espera.
Benedito ouviu gritos e xingamento.
Armadilha parecia que era.

Benedito tinha orgulho de sua cor.
Isso podia ser visto em sua carreta.
Além de potente motor
o cavalo e o reboque na cor preta.

Saíram de novo na perseguição.
Ultrapassaram ofendendo aos gritos.
mantendo o ritmo do caminhão
caminhoneiro ignorou palavrões ditos.

Alguns quilômetros a frente
Benedito presenciou triste cena.
Ocorrera um violento acidente.
Mostrou que a alma não era pequena.

No carro, aquele grupo familiar
que o ofendeu e atrasou sua viagem.
Benedito nisso não queria pensar.
Rancor e ódio não teriam margem.

O carro dependurado na ribanceira.
Uma árvore não o deixou despencar.
Do abismo, Benedito chegou á beira.
Mulher e crianças estavam a gritar.

Benedito logo percebeu
que a árvore não suportaria o peso.
Apesar de tudo que aconteceu
mantinha bom sentimento aceso.

Na carreta, uma corda resistente
amarrou com toda a firmeza.
Desceu a ribanceira rapidamente
e amarrou no carro com destreza.

A mulher em completa histeria
gritava que não queria morrer.
Para acalmá-la Benedito dizia
que não deixaria isso acontecer.

O motorista e marido
estava desacordado.
Talvez estivesse ferido.
Sobre o volante debruçado.

As crianças estavam assustadas
não com o acidente e sim pela gritaria.
Por Benedito seriam ajudadas.
Para salvá-las, tudo faria.

Tirou primeiro uma criança.
Depois da outra, foi a vez.
De salvação aumentou esperança.
Com a mulher, já resgatara três.

O motorista inconsciente
seria bem mais difícil.
Retirá-lo tornara-se urgente.
Carro ameaçava cair no precipício.

Outra corda foi bem amarrada
presa nos eixos do conjunto.
Sebastião, pessoa arrojada,
tentaria trazer o homem junto.

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Amarrou-se pela cintura
e desceu ao carro suspenso.
Sebastião superava aquela agrura
pois era um momento tenso.

Chegou ao carro e pela janela
entrou para salvar o motorista.
Era difícil situação aquela.
Apesar de tudo, estava otimista.

Amarrou o homem desacordado
na mesma corda que o sustentava.
Soltou o cinto e puxou-o de lado.
Percebeu que a corda estalava.

Uma corda arrebentou de repente.
O carro despencou no abismo.
Benedito e o homem inconsciente
ali em condição de imobilismo.

Presos pela corda, suspensos
Benedito pensava em uma solução.
De todos os perigos imensos
aquele era o de maior dimensão.

Benedito gritou para a mulher
que ligasse para o socorro.
Naquele distante lugar qualquer
sinal era bloqueado pelo morro.

Benedito teria de virar-se sozinho.
Conseguiu da corda se soltar.
Até o alto da rodovia, único caminho.
Escalando conseguiu chegar.

Explicou o que pretendia fazer.
Com a carreta, faria seu resgate.
Lentamente o bruto começou a se mover.
O homem ainda estava fora de combate.

A carreta andava lentamente,
puxando a corda com cuidado.
O homem subia vagarosamente.
Finalmente conseguiu ser içado.

A família em desespero
pensando que ele tinha morrido.
Benedito manteve calma o tempo inteiro.
Não fosse ele, estaria tudo perdido.

Tentou reanimar o patriarca.
Respirava e tinha pulsação.
Benedito mostrava sua marca:
Dignidade, solidariedade e doação.

O homem acordou assustado.
Esposa e filhos dando amparo.
Olhava Benedito preocupado.
Tê-lo ofendido custou bem caro.

Para o hospital precisava ser levado.
Benedito ofereceu uma carona.
Na cabine o grupo ajeitou-se apertado.
Vergonha da família veio a tona.

O homem repousava na cama leito.
Haviam feito uma coisa medonha.
Ofenderam um homem direito.
Todos estavam mudos de vergonha.

O caminhoneiro por sua vez
sentiu que remoíam suas culpas.
Percebeu que aquela mudez
era como um pedido de desculpas.

Deixou-os em um hospital.
Na estrada escrevia sua história.
Para ele fora ao final
contra o racismo a sua vitória.

Roberto Dias Alvares

Roberto Dias Alvares

Casado com uma mulher linda. Pai de filha abençoada. Santista ainda. Escritor e poeta da estrada.

3 thoughts on “RACISMO NA ESTRADA – Cavalo Mecânico Volvo NL 12 6×4

  • Lindo!

    • Robertosantista

      Elder, obrigado por comentar e deixar registrado. Que bom que gostou da história. Grande abraço.

  • robertosantista

    Como em qualquer atividade, muitas vezes o caminhoneiro é discriminado não só pela cor da pele mas pela sua própria atividade, sendo considerado por pessoas desinformadas como aquele que usa o tamanho de seu veículo para por em perigo a vida alheia. Ma pena que essa imagem seja disseminada. Benedito mostrou como agir contra o racismo

Fechado para comentários.

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