Roberto Dias Alvares‏Z-Colunas

UMA PEÇA DO DESTINO – Mercedes Benz LP 321 6×2

Gilberto era caminhoneiro.
Fazia transporte de batata.
Tinha orgulho de seu estradeiro:
Mercedes Benz cara chata.

Pela sua mãe foi bem criado.
Seu pai a abandonou na gravidez.
Cresceu aprendendo a ser honrado.
O que ganhava mal dava para o mês.

De seu pai, possuía uma fotografia.
O que restara dele era a única imagem.
Se um dia visse aquela fisionomia,
diria a ele quem era com toda coragem.

Lobato, assim se chamava
e não esperou Gilberto nascer.
A mãe do rapaz o amava,
mas este amor não fez por merecer.

Gilberto estudou com dificuldade
mas tinha um sonho em mente.
Ser caminhoneiro, na realidade,
era o que pensava somente.

Com muita luta e sacrifício
conseguiu comprar seu estradeiro.
O começo para ele foi difícil,
mas tornara-se bom caminhoneiro.

Ia até a cidade de Guarapuava
dirigindo com orgulho o caminhão.
Muitas sacas de batata levava.
Fazia firme e segura condução.

Caixa de câmbio era macio o engate.
Aquela região as temperaturas eram baixas.
Levava sacas de batata, às vezes tomate,
acomodados em uma infinidade de caixas.

Seu Mercedes Benz era turbinado.
Não era original o motor.
Dez pneus novos no rodado.
Sabia dar a sua máquina todo valor.

Saindo de área produtora
passava antes em sua casa.
Não dependia de transportadora
pois levava direto ao CEASA.

A cabine e a carroceria eram verdes.
Tratava-se de um bruto bem cuidado.
Sentia orgulho de seu Mercedes.
Quinze mil quilos levava no trucado.

Aquela era uma viagem de rotina.
Mas Gilberto viveu difícil situação.
A bordo no conforto da cabina,
conduzia tranquilo seu caminhão.

Dirigindo seu Mercedes cara chata
saiu carregado de Guarapuava.
Com muitas caixas de tomate e batata,
São Paulo, para o CEASA levava.

A chuva começou a cair,
trazendo mais dificuldade.
Gilberto atento ao dirigir,
andava em média velocidade.

Quando passou a cidade de Londrina
a chuva caía intensa e grossa.
Em alguns trechos havia neblina.
Naquele ponto a água fazia imensa possa.

De São Paulo cruzara a divisa.
Andava bem seu caminhão.
Fazendo condução precisa.
Atravessou á sua frente um cão.

Era um cachorro vira-lata
cruzando a pista de lado a lado.
Chamou no freio seu cara chata.
Arrastou pneus o seu trucado.

A pista molhada e escorregadia
fez seu caminhão deslizar.
Acabou entrando em uma fria
para a vida do bicho poder salvar.

O caminhão quis sair de lado
com isso atravessaria na pista.
Gilberto não ficou apavorado,
afinal era muito bom motorista.

Endireitou seu caminhão.
Conseguiu fazê-lo parar.
Escutou barulho de colisão.
Carro não conseguiu desviar.

Bateu atrás de outro caminhão
que também freou bruscamente.
No carro completa destruição.
Havia uma única pessoa somente.

Gilberto desceu do bruto rapidamente.
Em seu caminhão, nenhum dano.
Jovem no volante estava inconsciente.
Podia se ver a sua testa sangrando.

Não usava o cinto de segurança
por isso havia se machucado.
Que não fosse grave tinha esperança.
O socorro foi logo chamado.

O caminhoneiro envolvido
estava bastante assustado.
Achou que seria detido,
mas do acidente não fora culpado.

O caminhoneiro ao amigo tranquilizou,
dizendo que ficaria tudo certo.
Que se acalmasse, para ele falou.
Era homem sensato o Gilberto.

O cão que causou o estrago
à beira da pista observava indiferente.
Igual bêbado que ganhou mais um trago
latia feliz e e parecia rir daquela gente.

Gilberto procurou reanimá-la.
Felizmente tinha respiração.
Tentaria com cuidado acordá-la.
Chamou-a várias vezes, em vão.

Para chegar, acabara sua pressa.
Com a jovem, estava bem preocupado.
Mas que menina seria essa
que o deixara assim tão angustiado?

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Quando ela foi levada ao hospital
Gilberto tinha de saber seu estado.
Com seu caminhão foi até o local.
Até um quarto foi encaminhado.

A jovem já estava acordada
e o médico vendo a preocupação,
disse a Gilberto que a acidentada
tivera apenas pequeno arranhão.

Passaria a noite em observação.
De manhã seria liberada.
Para a família iria fazer ligação,
Pois ela precisava ser avisada.

Gilberto contou quem era
e como ela havia se acidentado.
Se desejasse, ficaria a sua espera.
Como acompanhante estaria a seu lado.

Foi assim que ele ficou sabendo
que ela morava na capital paulista.
Uma carona acabou oferecendo.
Boa companhia rodando pela pista.

Apesar de não causar o acidente
de certa forma, ele se sentia culpado.
Naquele momento queria somente
levá-la para casa com todo cuidado.

Para sua família contou tudo.
Por telefone explicou que estava bem.
O carro dela contudo,
parecia atropelado por um trem.

A menina se chamava Luíza.
Tinha vinte anos de idade.
Bela, inteligente e concisa.
Seu olhar transmitia felicidade.

Ela aceitou o oferecimento,
afinal, não poderia ir dirigindo.
Sem perder um só momento,
começo da tarde estavam partindo.

Ela achou um pouco estranho
fazer uma viagem daquele jeito.
Um veículo de grande tamanho.
E mal conhecia aquele sujeito.

Mas ele fora tão generoso
e não a abandonou afinal.
Demonstrara ser bondoso.
Pagou a conta do hospital.

Era uma linda acompanhante,
para conversar, boa companhia.
Dona de uma alegria contagiante.
Esbanjava charme e alegria.

Gilberto falou de sua vida,
e ela falou de seus pais.
A jornada de ambos parecida.
Corações deles perderam a paz.

De seu pai ela tinha orgulho.
Ele tinha orgulho de sua mãezinha.
Riam e conversavam de fazer barulho.
Ela não gostava de ficar sozinha.

O Mercedes trezentos e vinte um
levava a alegria em sua cabina.
Tinham tanta coisa em comum.
Encontrarem-se era a sua sina.

Parecia que Luíza e Gilberto
estavam ligados por invisível laço.
Eles não sabiam ao certo,
mas o destino dava decisivo passo.

Faltava cem quilômetros para chegar
mas a noite chegou depressa.
Gilberto achou melhor parar,
afinal não adiantaria ter pressa.

Disse para a moça não se preocupar
que parariam em um lugar seguro.
De manhã terminariam de chegar.
O céu sem estrelas, bem escuro.

Em uma parada de caminhoneiros
jantaram após refrescante banho.
Saborearam um arroz carreteiro.
Sabor inigualável e sem tamanho.

Para ela ficar acomodada,
haviam ali pequenos apartamentos
Ajudaria a estar recuperada.
depois dos últimos acontecimentos.

Gilberto ficou na cabine do caminhão.
Havia ali sofá-cama bem confortável.
Cortina, da privacidade era a proteção
e a certeza de um sono agradavel.

Acordaram no outro dia
ambos com boa aparência.
Em casa ela chegaria.
Separação tinham ciência.

A jovem disse comovida
que Gilberto era encantador.
O rapaz sentiu a alma mexida.
Entre eles brotava o amor.

Gilberto perguntou a Luíza
se queria ser sua namorada.
A jovem, suave como uma brisa
disse que se sentia encantada.

Descarregou seu caminhão
e a levou até seu lar.
Momento de alegria, emoção,
quando a família á viu chegar.

Sua mãe e seus irmãos
a receberam com muito amor.
Para Gilberto, aperto de mãos,
afinal, dela era o herói e salvador.

Após o carinho familiar
para Luíza, algo faltava.
De repente brilhou seu olhar.
Seu pai naquele instante chegava.

Correu até seu pai querido
e o abraçou efusivamente.
Gilberto ficou comovido
ao vê-la assim contente.

Suas feições mudaram contudo,
quando ao pai dela foi apresentado.
Gilberto ficou paralisado, mudo.
Era o pai que o tinha abandonado.

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Cumprimentou-o mecanicamente.
Não sabia bem o que dizer.
Pensou em sua mãe somente.
E agora o que iria fazer?

Era dupla a decepção
que teve naquela manhã.
Aquela que despertara seu coração,
era na verdade a sua irmã.

Não causaria confusão.
Mas com seu pai iria conversar.
Esperaria a melhor ocasião,
e tudo para ele iria contar.

Como era fim de semana
a ficar com eles, foi convidado.
Luíza apresentou sua mãe, Ana,
o rapaz que a tinha ajudado.

Ela agradeceu-lhe de coração.
Gilberto estava constrangido.
Falou que teria eterna gratidão.
Por tê-la sã e salva trazido.

Foi feito saboroso almoço.
A comemoração para ele era vã.
Luíza notou a tristeza do moço.
Como contar que ela era sua irmã?

O rapaz pensou ser chegada a hora.
Gilberto chamou o pai de Luíza.
Pediu para conversar com ele lá fora.
Começou a suar a camisa.

O que precisava conversar
dizia respeito a difícil situação.
Ali não podia com ele falar.
Foram dar uma volta de caminhão.

Foram até um distante parque.
Nenhuma palavra pronunciada.
Do caminhão o desembarque.
Sentaram em banco na calçada.

Aquele assunto para ele, sofrido.
Mas não haveria mais espera.
Ao vê-lo o tinha reconhecido.
Lobato, pai de Gilberto era.

Para que dúvida não ficasse
sua história para ele contou.
De Lobato, lágrima rolou da face.
Ao terminar Gilberto também chorou.

Lobato pediu perdão
pelo que fez a Gilberto.
O rapaz falou com razão
para perdoar tinha coração aberto.

Isso só não era suficiente.
Lobato teria de contar a verdade
para sua família urgentemente.
Esclarecer tudo era necessidade.

Lobato relutou bastante,
mas Gilberto exigia a confissão.
Afinal Luíza naquele instante,
Alimentava por ele uma paixão.

Ela pensava naquele momento
que Gilberto pedia autorização.
Namoro de ambos, consentimento.
Dela seria grande a desilusão.

Lobato não tinha opção.
Seria da família a ruína.
Luíza aguardava no portão,
quando desceram da cabina.

O sorriso dela logo se desfez
quando viu de Gilberto a fisionomia.
O que acontecera desta vez?
Luíza, por antecipação já sofria.

Com esposa e filhos reunidos
Lobato começou a falar do passado.
Acontecimentos pelo tempo escondidos,
Tudo teria de ser agora revelado.

Quando jovem teve envolvimento
e grávida abandonou uma menina.
Isso para sua alma fora tormento.
O remédio, a verdade cristalina.

Disse que era tolo e imaturo
e que não assumiria nada.
Para a família um golpe duro.
A sua esposa ficou arrasada.

Aquela jovem abandonada
tivera um belo menino.
Manteve-se digna e honrada.
Aguardou justiça do destino.

Destino ou Divina Providência.
Luíza cruzou a vida de Gilberto.
Tiveram uma curta vivência,
mas queriam um do outro ficar perto.

Quando Gilberto reconheceu Lobato
tendo certeza ser seu pai legítimo,
agiu como um homem sensato.
Sentia-se satisfeito no seu íntimo.

Luíza chorava desconsolada.
Gilberto aproximou-se no afã.
Disse: “Perdi uma linda namorada
mas ganhei uma maravilhosa irmã”.

As lágrimas de Luíza, ele secou
e abraçou-a com devoção.
Pela mão, Gilberto a pegou
conduzindo-a até seu caminhão.

Levou sua irmã para passear.
Enquanto rodava, uma boa conversa.
Quando resolveram para casa voltar,
na alegria ela estava imersa.

Gilberto fez uma promessa:
Jamais a perderia de vista.
Sempre a visitaria sem pressa.
Com nova vida estava otimista.

Todos perdoaram Lobato.
Até mesmo a mãe de Gilberto.
Ele mostrou-se arrependido de fato
e dos filhos estaria sempre perto.

Roberto Dias Alvares

Roberto Dias Alvares

Casado com uma mulher linda. Pai de filha abençoada. Santista ainda. Escritor e poeta da estrada.

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