Era tudo novidade para Marina.
Ia para a escola pela primeira vez.
Com seu pai dentro da cabina.
A bordo do Scania Vabis setenta e três.
O Scania em suave empuxo
parou a frente do portão principal.
Buzinavam nervosos, carros de luxo.
A menina achava o Scania sensacional.
Ela desceu acompanhada do pai.
Olhou para o colégio meio perdida.
Ouviu a voz paterna dizendo: “Vai”.
“Estude e será alguém nessa vida”.
O pai a levava quase todos os dias
e a menina mostrava ser inteligente.
O tempo passava e Marina crescia.
Logo se tornou uma bela adolescente.
Certo dia pediu a seu pai
que a deixe na esquina.
Meio envergonhada ela sai.
Parece constrangida a Marina.
O Scania agora é coisa medonha,
assim pensa Marina do caminhão.
Seu pai, carinhoso nem sonha,
mas ela sente deles muita vergonha.
Seus amigos chegam em carros bonitos
e ela chega naquele mastodonte.
Muitos deles se fazem de ricos.
Na cabina, ela vê do alto o horizonte.
Seu pai entende o sentimento da filha.
Afinal aquele colégio é de gente granfina.
Quando olha para ele, o olho dela não mais brilha.
Mas como ele ama aquela pequena menina.
O pai a bordo do cavalo mecânico
agora não é mais motivo de orgulho.
Meninos se comportam com jeito britânico.
Meninas cochicham em suave marulho.
Permaneceu naquele colégio
faziam nove anos aquela altura.
Marina terminava o ensino médio.
Aquele ano seria sua formatura.
O pai trabalhando sem parar
dirigindo Scania Vabis trucada.
A mensalidade do colégio tinha de pagar.
Afinal sua filha ali seria bem ensinada.
A agora adolescente Marina
sentia vergonha de ser pobre.
Lamentava-se de tudo a menina.
Queria pertencer à família rica e nobre.
No dia da formatura do ensino médio,
Em vez do pai, foi acompanhada de amigo.
Contra a família cometia sacrilégio.
Na festa, pai e mãe não ficaram consigo.
O casal sozinho sentado à mesa
disfarçava a tristeza que sentiam.
A jovem estava linda qual princesa.
Ela e grupo de amigos se divertiam.
A mãe usava um bonito vestido.
O pai, sapato, camisa e uma velha calça.
Sentiu o seu coração partido
pois a filha com ele não dançou a valsa.
Vida que segue e o pai a trabalhar
passando horas naquela cabina.
A filha iria fazer o vestibular.
Tentaria o curso de Medicina.
A bordo do antigo Scania Vabis
em oração estava o pai de Marina:
“Pai poderoso, vós que tudo sabes,
me ajude a formar a filha em Medicina”.
Do caminhão não conseguia fazer a reforma.
Quase todo dinheiro para pagar a faculdade.
Pensava: “Mais um pouco e a filha se forma”.
Assim, não viveria mais na dificuldade.
Marina já era uma mulher adulta
prestes a se tornar uma médica.
Mostrava-se inteligente e culta.
Além de agir sempre com ética.
Olhava seu pai de outro jeito,
reconhecendo todo o sacrifício.
Em vez de vergonha tinha respeito.
Sabia que para eles a vida era difícil.
Marina fez para si uma promessa,
que estaria ao lado do pai na formatura.
O tempo passava bem depressa.
Estudava para levar aos doentes a cura.
Faltava um ano para se formar
e seu pai caiu enfermo.
Aquele homem tinha de se tratar.
Marina encaminhou tudo a bom termo.
Estudante dedicada e com competência,
dos professores tinha o respeito geral.
Usou o que pode de sua influência
e internou seu pai naquele hospital.
Ele foi tratado com carinho
mas a doença era muito grave.
Marina não o deixava sozinho.
Câncer, para os médicos um entrave.
Foi usado o melhor recurso
para tentar buscar a cura.
Em breve Marina concluiria o curso.
Mas a situação de seu pai era dura.
Aquele velho carreteiro, sem medo
com força moral diante de situação escura
disse a filha: “Guarde um segredo”.
“Pedi a Deus para viver até sua formatura”.
Com lágrimas escorrendo pelo rosto
Marina procurava mostrar ser forte.
Mas vendo o pai assim dava desgosto.
A medicina perderia a guerra contra a morte.
No dia da colação de grau
Marina usava beca impecável.
Seu pai havia saído do hospital.
Enfrentava aquela doença incurável.
Durante aquela noite magistral
houve uma festa e comemoração.
Marina ficou com o pai até o final.
Ele fora o responsável por sua formação.
Ao lado da mãe, linda cena.
Uma família unida pelo amor.
Seu pai disse que valera a pena.
Pela filha tanto sacrifício e suor.
No dia seguinte aquele carreteiro
deixava para sempre a estrada.
Lutara como herói verdadeiro.
E sua luta foi enfim recompensada.
Marina se tornou grande profissional.
Cirurgiã de talento raro.
Trabalhava em um famoso hospital.
Á sua mãe ela deu todo amparo.
Entra no consultório com sua maleta.
Pacientes em busca de uma cura.
Sobre a mesa uma pequena carreta.
Cavalo mecânico Scania em miniatura.
Alguns pacientes vencidos pela curiosidade
perguntam o por que daquele caminhão.
Marina responde suspirando de saudade:
“Foi com ele que meu pai garantiu minha formação”.
“Se hoje sou uma médica conceituada
e pude viajar por vários locais do planeta,
foi porque meu pai cortando estrada,
ganhou dinheiro dirigindo uma carreta”.
Quando o dia de trabalho é findo,
Marina se dirige ao estacionamento.
Embarca a bordo de um Scania lindo.
Ao volante do bruto é vista nesse momento.
Reformou o Scania Vabis jacaré
e com ele para todo lado vai.
Aquele cavalo mecânico para ela é
lembrança do grande homem que foi seu pai.
Roberto Dias Alvares
11 comentários
É uma ótima história. Pois todos que trabalham com caminhão ou ja trabalharam, sabem o quanto é difícil e sofrido, e com certeza irao se emocinar. Noites e noites em claro longe das pessoas que vc ama. Nas datas importantes muitas vezes longe de sua familia. Nota 10.
Alexandre Silveira
Obrigado pelas palavras Alexandre. A vida dos caminhoneiros, suas lutas e seus sofrimentos são uma fonte de inspiração. Gostaria apenas de ressaltar que a minha obra AVENTURAS DE UM CARRETEIRO PELA AMÉRICA retrata um pouco as dificuldades, mas também o heroísmo do caminhoneiro brasileiro.
Realmente emocionante. Muitas vezes somos criticados e humilhados em muitos locais, pois o motorista não é valorizado e nem compreendido, e as pessoas esquecem que atraz daquele caminhão tem um pai de família que muitas horas é dias passa trabalho, perigo, solidão e muita saudade. Mas não podemos parar pois é dali que tiramos nosso sustento e mantemos nossa família com dignidade, apesar de todo sofrimento . “DEUS ACIMA DE TUDO”
Tô realmente emocionado, lê duas vezes em todas elas não conti as lágrimas, também tenho duas filhas e é na estrada que trago o nosso sustento ,mas com Deus na frente, sigo em frente!!
Weslei, obrigado pelas palavras. Confesso que até mesmo eu me emocionei e quando a escrevi não tive a real noção do quanto ela retrata a vida dos caminhoneiro sensuais lutas e dificuldades tudo sempr com o intuito de levar o bem estar a suas famílias.
É o que agente passa na estrada trabalhamos para dá o melhor para nossas famílias e assim mesmo nós somos criticados pó pessoas preconceituosas não sabe o que nos passar nas estradas o perigo em todos os centidos mais Deus é mais cada batalha nos venceremos em nome do todo poderoso
Luiz Antônio, sei o quanto o caminhoneiro sofre e é criticado. Se acontece um acidente o caminhoneiro é culpado e o tráfego não anda adivinha de quem é a culpa? Mas essas pessoas não têm a noção de quem está atrás do volante é um pai de família que sofre e tem seus problemas.
Obrigado por comentar.
Bom dia sou caminhoneiro fiquei muito emocionado com a história também tenho duas filhas
Carlos Henrique
Carlos Henrique essa realmente é uma história comovente e apesar de ser ficção retrata a realidade de muitos pais caminhoneiros que se sacrificam pelos filhos.
Obrigado por comentar e grande abraço.
Linda história , enfatizando poeticamente o que nos caminhoneiros já passamos, ou iremos passar.
Me emocionou a ponto de deixar q as lágrimas fluissem de meu rosto, pois tenho uma filha e meu finado pai q também era caminhoneiro faleceu desse mal do século que é o câncer.
Rodrigo San, que bom que você gostou da história. Não sou caminhoneiro mas sei o quanto muitos de vocês sofrem e se sacrificam para garantir o bem estar da família.
Obrigado pelo comentário.